sexta-feira, 23 de dezembro de 2016

A maldição do bom dia




Descia as escadas do edifício apressadamente. Estava atrasado e tinha acordado com muito mau humor. Não queria encontrar ninguém no elevador e ser obrigado a dar bom dia seguido de um sorriso forçado. Os pensamentos da noite anterior não o deixaram chegar perto da cama. Cigarro, leitura, televisão, internet... nada conseguiu expulsar todas aquelas imagens da sua cabeça, as discussões, as palavras que deveriam ser ditas e não foram... Um comprimido, talvez? Não, teve medo de não acordar no horário do dia seguinte. Resultado: sem o comprimido, perdeu não só uma boa noite de sono como a tão planejada hora certa, hora de chegar, de resolver tudo aquilo que não lhe deixara deitar a cabeça no travesseiro e dormir.

Seu vizinho de porta  teve a mesma ideia e também resolveu descer pelas escadas. Sentiu-se perseguido e começou a correr, descer quase que escorregando pelos degraus, começou a suar e seu coração acelerou. Para onde corria? De quem corria? Por que corria? Não teve tempo de responder: tropeçou no carpete que se encontrava logo abaixo do último degrau e foi ao chão sem ter tempo de se segurar. Desfaleceu com a pancada e, quando acordou, estava rodeado por um monte de pessoas, pessoas que ele havia evitado encontrar no seu caminho para o trabalho. Foi ajudado por algumas delas, obrigado a sorrir, agradecer a gentileza e, ao olhar o relógio, ter a certeza de que por causa delas, havia perdido a reunião. Odiava perder. Entretanto, de uma só vez, havia perdido a noite, a hora e o seu direito de permanecer em silêncio a fim de desfrutar o seu mau humor. 


(https://ednene.files.wordpress.com/2011/09/mauhumor.jpg)


(23/12/16)

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