terça-feira, 12 de janeiro de 2010

Mentego (a idéia fixa)

Cenário perfeito: falta de sono, duas da manhã, silêncio de monastério, uma tela de computador, meus óculos a La Vinícius de Moraes e a minha mente, totalmente vazia. Quase totalmente. Nela uma única idéia: tenho que escrever algo antes de dormir. Eu posso até não gostar do que vou escrever, mas com certeza alguém poderá ler, um louco poderá gostar e um totalmente insano poderá até publicar. Entretanto é melhor não salvar o texto agora e tentar terminar. Eu salvo no meio da produção, não gosto e o texto se torna mais um arquivo com um nome estranho dentro de uma pasta “para terminar” e que nunca será terminado.

Já passei do primeiro parágrafo e confesso que a idéia continua a mesma: tenho que escrever. Saber o quê, já seria um milagre. Acho que é a medicação da gripe que estou tomando... Daqui a pouco bate duas e eu não fiz nada e ainda tenho que tomar mais medicação. Gripe chata, minha única companhia a essa hora da madrugada.

Quem sabe se eu futucar algum site? Nossa! Não teve nada a ver terminar um parágrafo falando de gripe e logo depois começar o outro com essa frase e ainda mais usando o termo “futucar”. De onde foi que eu tirei isso, meu Deus? Futucar um site? Que pérola de frase, totalmente upgrade com a tecnologia, no mínimo terei que procurar uma vara virtual para futucar melhor. Iiiih, se isso foi a intenção de ser uma piada, esqueça. Eu não riria nem por dentro. Ok, vamos ver o que posso fazer para terminar esse aqui... Pronto. Assim.

Já cheguei ao terceiro, olho o relógio e... Não, não vou informar a hora, pra que a pessoa que vai ler o meu texto precisa saber da hora? Quem tem que saber a hora de tomar o remédio na hora certa sou eu. E pronto. Fim de papo. E de parágrafo também.

Uau, esse foi bem curto. Deveria salvar, não? Poxa, já usei mais do que meia página em 10 minutos! Hum, acho que não vou colocar este no “para terminar”. Bem, na dúvida, continuo. Agora com pausa para tomar o remédio.
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Será que os pontinhos acima convenceram como pausa? Calma, eu só estou ensaiando, ainda não é pausa para valer. Quando for é óbvio que eu avisarei. Não vou sair do nada e deixar a pessoa que está lendo o meu texto perdida. Vou sair agora. Pausa.
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Poxa, precisou de mais pontinhos do que eu pensei. A pausa foi longa, mas a culpa foi do comprimido.Tenho medo de deixá-lo correr livre e solto pela minha garganta. Vai que ele resolva conhecer outras vias e eu morra asfixiada? Vou deixar um texto pelo meio, a minha mente com a idéia de ter de escrever algo e...não,não,não! Vai que meu espírito volte e fique vagando para terminar o texto? Vai que sem querer alguém (a pessoa que me encontrar morta) resolva dar ao texto um final mais infeliz que o meu mandando o coitado para a temível pasta “para terminar”? Aí ficamos nós dois sem paz: ele, o texto, sem um fim e eu querendo dar um fim a ele sem aceitar o meu fim. Alma penada? Eu? Nem que me depenem! Tenha pena de mim! Não, não mesmo. Fico na vigilância até o comprimido descer e chegar sã e salvo em alguma parte do meu estômago que fará conexão com a parte do corpo que está “assim,assim”.

Engraçado, depois de toda essa volta ao redor do comprimido que me tomou um parágrafo inteiro (e gigante!), me veio o seguinte pensamento: será que na verdade eu não queria escrever nada e tudo isso foi uma peça pregada pela minha mente só para eu não esquecer de tomar o meu remédio? Será que minha própria mente seria capaz de fazer isso comigo? Fazer com que eu perdesse parte da minha madrugada de sono para ficar zumbiando e me fazer acreditar que eu poderia escrever algo grandioso (que poderia até ser publicado pelo “totalmente insano” lá do início do texto) só para me lembrar de tomar o remédio? Não, isso é loucura. Achar que a minha mente está tramando contra mim mesma. Isso é definitivamente lou-cu-ra! Imaginar que a minha própria mente está tramando contra mim mesma?

Minha e mim mesma, na mesma frase? Que coisa mais egoísta! Acho que... Lógico! Egoísta, ego, foi ele! Meu ego me fez acreditar que a minha própria mente estava tramando contra mim para lembrar de tomar o meu remédio quando na verdade era ele que queria ser lembrado quando o “totalmente insano” publicasse esse texto que poderia ser algo grandioso deixado para a tal da posteridade. Como pode isso? Como é super, como se sente único, como é o ego egoísta!

Pois justo agora me ocorreu uma idéia, não para o texto, mas para comprovar a verdade. A verdade de que a mente é inocente nessa história, pelo menos nessa história desse texto que vos escrevo. Vos? Não sei se será mais de uma pessoa que vai ler, então, na dúvida, é melhor “desse texto que te escrevo”. A verdade, sim, a verdade! O ego quer me confundir para eu não falar sobre a verdade, já obtive a prova de sua culpa! Se realmente fosse a mente que estivesse por trás desse texto, eu teria terminado logo depois que tomasse o comprimido, visto que a intenção da minha mente era escrever algo para lembrar do meu remédio. Contudo, o texto continuou e os auto-elogios foram se sucedendo a tal ponto que ficou mais do que claramente óbvio que foi o ego, egoísta, super. Até jogo de palavras ele está usando para se disfarçar (como o fez no penúltimo período).

Tarde demais. Em ambos os sentidos: tarde demais. São mais de duas da manhã e vou mostrar ao ego que se ele é super, eu sou maravilha. E mulher! Junte os dois, querido ego, e veja o resultado. Se é que você conseguirá ver algo mais, pois o seu algo grandioso termina aqui mesmo e não darei tempo nem para tal do insano...

(24/03/07)







Origem da imagem:diannejohnson.com

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